Confiram a matéria escrita por Alex Villegas.
“O mundo da fotografia de estúdio é simplesmente fascinante. Na minha opinião, é o mais interessantes dos ambientes da fotografia – uma vez que nele não temos qualquer luz, o fundo infinito se apresenta diante de nós como uma folha em branco.Uma folha que nos permite realizar qualquer idéia ou projeto, desde que tenhamos a compreensão e habilidade para tanto.”
O estúdio desafia nossa capacidade de observação, compreensão e recriação, nos forçando a consultar todo nosso acervo de memórias e observações, a usar toda a nossa capacidade técnica para concretizar uma idéia predeterminada – e o nosso sucesso depende do quanto conseguimos ser fiéis a essa idéia com a imagem final. O estúdio é o simulador universal, onde podemos fazer a noite virar dia, o dia virar noite, criar um ambiente cheio de janelas ou um dramático cenário de teatro.
Mesmo fora das quatro paredes do estúdio, a capacidade de recriar, interferir e moldar a luz é muito útil. Em ramos como a fotografia corporativa, industrial ou de arquitetura, nem sempre a luz existente é suficiente ou adequada para cumprirmos nossa missão, então adicionamos, misturamos e substituímos, num processo quase alquímico em busca da imagem.
Às vésperas do maior evento de fotografia de estúdio da América Latina, é normal que o interesse por ele se expanda – e de julho para frente, chovem questionamentos por email e redes sociais, questionamentos esses que vêm especialmente dos iniciantes. Fotógrafos que já têm uma base técnica razoável e subitamente resolvem tomar a iniciativa de dar o próximo passo. E o que eles desejam saber?
Separei as questões mais importantes – dez coisas que eu adoraria que tivessem me contado antes do meu atribulado começo. Nenhuma resposta aqui é definitiva ou irrefutável, e com certeza não são a única maneira de trabalhar ou de responder à pergunta. Mas devo dizer que elas têm funcionado, da maneira que estão expostas aqui. Então vamos a elas:
1 – Que câmera devo ter para trabalhar em estúdio?
Não dá para responder a esta pergunta sem saber exatamente qual o seu produto final. Câmeras, em estúdio, não precisam ser seladas contra as intempéries, e se você trabalha com flashes, também não precisam fazer 10 quadros por segundo. Os flashes não irão acompanhar essas velocidades.
Configurações de ISO elevadas também não costumam ser uma necessidade real para quem trabalha em estúdio, visto que temos o controle da luz na imensa maioria das – senão em todas – ocasiões. Então o que nos sobra de importante é a qualidade de imagem e resolução – que estão intimamente ligadas.
Qualidade de imagem (em termos de nitidez, latitude e resposta de cor) está conectada diretamente ao sensor; quanto maior, melhor. Por motivos de economia, a escolha mais popular está nas câmeras com sensores 24 x 36mm (vulgarmente chamadas de full frame), Canon, Nikon ou Sony. Mas os preços das digitais de médio formato estão caindo, e a Pentax 645D, de 40Mpx está sendo vendida por US$ 10 mil nos EUA. Um um belo passo acima temos a Hasselblad H4D, a Phase One 645DF, que aceita backs digitais de até 80Mpx e a Leica S2.
Topo definido, calcular sua necessidade em termos de custo-benefício é relativamente simples: veja qual a resolução necessária para o seu principal produto. Se o seu ganha-pão serão os retratos ou books fotográficos (que raramente ultrapassam os 25×38), 15 megapixels serão suficientes para produzir esses books sem interpolação. Eventuais banners, posters e outdoors podem aparentar precisar de mais, mas sempre temos a possibilidade de interpolar um pouco, e a distância de visualização é sempre nossa aliada.
Verificando as características acima, temos excelentes candidatas ao troféu “câmera de estúdio, categoria custo-benefício”: a Canon 5D MKII, de 21 Mpx, a Nikon D700, de 12 Mpx, e a Sony A850, de 24,6 Mpx. Todas full frame, e com recursos de sobra para a tarefa. O que não significa que não se possa usar uma camerinha de entrada, mas a ergonomia e resistência não são as mesmas.
E sempre há a possibilidade de se alugar backs digitais ou câmeras de médio formato para trabalhos específicos.
2 – Quais as lentes que preciso comprar para usar no estúdio?
Isso vai dos seus enquadramentos favoritos e do que está fotografando – mas as lentes que são o arroz com feijão do estúdio são a 50mm f/1.8 ou f/1.4 e a 100/105mm f/2.8 macro/micro (Canon/Nikon). Não conheço fotógrafos que tenham queixa dessas duas lentes – nítidas, claras e acessíveis. Angulares são adições bem-vindas à brincadeira, uma 28mm trará muita versatilidade ao conjunto. Caso prefira as lentes zoom, a 28-70 f/2.8 e a 70/200 f/2.8 (ou a f/4) dão conta do recado, e muito bem, embora os fotógrafos de produto dêem nítida preferência às fixas, especialmente às macro.
Não economize nas lentes. Câmeras ficam obsoletas rapidinho, objetivas duram a vida inteira.
3 – Existe algum conjunto de acessórios que seja essencial?
Não necessariamente. O problema é que flash é uma fonte de luz dura e pequena, então precisamos de acessórios para suavizá-la, controlar sua abrangência e aumentar seu tamanho aparente. Sua maneira de iluminar é que vai ditar quantas tochas, e que acessórios serão necessários. Partindo do set mais básico, que teria uma luz principal, uma compensação e uma contraluz, podemos pensar em:
Para a principal: três refletores de diferentes tamanhos (grande angular, padrão e para colmeia), que podem ser posteriormente suavizados com um pouco de tecrom ou papel vegetal, além de dois acessórios para aumentar o tamanho da luz – sombrinhas de 90cm e/ou softboxes de 120 x 90 são muito versáteis, e o softbox pode ter sua abrangência moldada facilmente com gobos ou tapadeiras; Para a compensação: normalmente, para a compensação são utilizados rebatedores apenas, mas um softbox 90×120 ou uma sombrinha de 120 cm fornecem luz grande e suave, de uma maneira “viva”, ou seja, regulável; Para a contraluz: embora contraluzes costumem ser pequenas e duras por tradição (vide a quantidade de colmeias e snoots que são vendidos para essa finalidade), contraluz suave é uma ferramenta muito útil. Além do clássico refletor de colmeia com uma ou duas colmeias e um snoot, experimente um softbox pequeno ou uma strip light (espécie de softbox alto e estreito) para obter contornos cheios de detalhes.
A luz se difunde basicamente por filtragem e reflexão, então muito papel vegetal ou tecrom é necessário para montar filtragens, e rebatedores também são necessários. Uma solução barata é comprar em boas papelarias papel vegetal em rolos de 30x1m, e preparar os rebatedores com placas de isopor. Uso rebatedores de isopor nos formatos 3x1m, 2x1m e 1x1m, todos pintados de preto de um lado para bloquear a luz (o que lhes dá dupla utilidade). Resultados excelentes também são conseguidos com madeira, MDF e lona fosca branca.
Com um pouco mais de verba e descobrindo suas soluções favoritas de iluminação, também é possível montar as tapadeiras/rebatedores no tamanho e formato desejados em madeira mais grossa e dotá-los de rodízios (rodinhas). Ocupa mais espaço, mas são muito bem acabadas e resistentes, além de bonitas.
4 – O que devo usar, monotocha ou gerador?
A diferença é sutil – um gerador é uma caixa que contém os controles e o sistema de acúmulo de energia comum a todo flash. Porém, para que ele possa trabalhar, a ele têm de ser acopladas lâmpadas – as chamadas tochas – via cabo. Uma monotocha se parece muito a uma tocha – as duas têm as lâmpadas na frente – mas ela também inclui o circuito de acúmulo de energia e os controles, ali na traseira. Nada de caixa. Assim como um caminhão baú, uma monotocha é uma solução completa e independente – um gerador se parece mais a uma carreta, que precisa do truck para puxá-lo, e este último precisa da carroceria para conseguir transportar alguma coisa.
Sou adepto dos geradores – mas convenhamos, eles são caros, muito caros. Minha predileção por eles se deve a três fatores:
Resistência – geradores são feitos para durar, assim como tratores, Fuscas e Harleys. Já vi geradores completamente descascados, amassados e batidos, mas funcionando normalmente;
Conveniência do controle – experimente colocar uma monotocha sem controle remoto em uma grua, a 3 metros de altura. Depois tente regular a potência dela. Sim, é terrivelmente inconveniente. Um assistente sentado ao lado do seu gerador consegue controlar até 3 fontes de luz sem sair do lugar. E como o sistema só depende de um receptor de rádio ou cabo de sincro, nada de preocupações com sincronização ou fotocélulas;
Potência – um gerador de 1200w consegue trabalhar com três tochas a 400w, uma tocha em 800w e outra em 400w, ou mesmo uma única tocha com os 1200w que o gerador consegue produzir. Quando se precisa de potência bruta, geradores são o que há de melhor.
Veja qual das vantagens lhe atrai mais, e qual das desvantagens pode ser decisiva – assim não vai errar na escolha do equipamento.
5 – E aí, preciso realmente de um fotômetro?
É bem provável que precise. Nada impede que se chegue a um excelente resultado sem o fotômetro, baseado na intuição, experiência e tentativa/erro. Mas fotômetros oferecem duas comodidades valiosíssimas: repetibilidade e facilidade de transposição.
Repetibilidade porque uma vez definido meu resultado, ele pode ser analisado exaustivamente com o fotômetro. Contraste da imagem, latitude, abrangência da luz principal, potência da contraluz e das luzes de efeito, tudo pode ser anotado e arquivado para posterior reprodução. Se eu precisar reproduzir qualquer aspecto daquela foto, de uma forma geral ou isoladamente, é questão de minutos de trabalho.
Facilidade de transposição porque um determinado visual pode ser criado com as mais variadas combinações de fontes de luz. Uma luz de janela pode ser feita com um softbox, uma parede branca ou uma janela mesmo. Então, conhecendo o contraste entre as fontes de luz nas mais diversas circunstâncias, posso trabalhar usando luz ambiente, flash, luz contínua ou mista, que dará tudo na mesma. O desenho da luz, as sombras e sua densidade estarão sob controle.
Posso me virar perfeitamente sem um fotômetro numa emergência, mas faço a mais absoluta questão de ter um – de preferência topo de linha – à mão durante os trabalhos. Faz uma diferença danada, e quando você se acostuma ao fotômetro, nem olha o LCD da câmera.
6 – Como e o que devo estudar para “ficar bom” em estúdio?
Em estúdio, um dos fatores mais importantes é a qualidade de imagem. Então, antes de partir para vôos mais altos, certifique-se que domina por completo os conceitos de exposição, leitura de histograma, profundidade de campo. Depois, comece a pesquisar a iluminação em si – um bom livro para começar é o Ciência, Luz e Magia, do Fil Hunter e Paul Fuqua. Considere participar de um fórum de fotografia em que se discuta iluminação.
Converse com bons fotógrafos, veja-os trabalhar. Se possível, seja assistente de algum, que tenha um trabalho que você ache bacana. Ver a teoria sendo aplicada por alguém experiente é valioso, muito valioso. Tenha referências: pesquise o tempo todo, veja as imagens de seus fotógrafos prediletos, imprima, analise, compre livros com fotos grandes. Pense em como parecem ter sido iluminadas, depois tente fazer igual. Pense grande, e pratique muito.
Desenvoltura com a luz demora para ser adquirida, e só a tentativa e erro fazem com que você se aproprie das técnicas que conhecerá através dos livros e dos fotógrafos.
7 – Como cobrar um trabalho de estúdio?
Essa é uma pergunta que demanda uma resposta complexa. Mas tudo é relacionado à sua frequência de trabalho, os custos fixos do seu estúdio (ou o valor da locação caso resolva locar) e o seu patamar de habilidade fotográfica.
Há no blog do fotógrafo Geraldo Garcia uma excelente série de artigos sobre precificação que pode ser de grande valia – http://blog.geraldogarcia.com/index.php/2009/05/como-cobrar-por-servicos-fotograficos-introducao.
Participar de uma associação como a Abrafoto (www.abrafoto.com.br) ou Fototech (www.fototech.com.br) também pode ser valioso. Ambas as associações possuem tabelas e planilhas disponíveis para os associados, além da eventual ajuda que outros membros mais experientes podem fornecer nessas horas.
8 – Como começar no mercado?
O começo é sempre complicado, para todos nós. Simplesmente abrir um estúdio e colocar uma plaquinha na porta da rua não é das melhores idéias que se possa ter, mas há algumas rotas para se iniciar nesse ramo:
Assistência: é a mais tradicional de todas. (Vejam a matéria sobre os Assistentes de Fotografia do Instituto Internacional de Fotografia) Assistentes de fotografia são sempre a nova geração de fotógrafos competentes, pois vêem o trabalho sendo feito por quem já está estabelecido, e um bom assistente sempre fica conhecido no mercado – tem contatos e conhece bons produtores, maquiadores, agências de modelos. A transição não é mais tão fácil quanto era antes – quando o fotógrafo acabava por ceder os trabalhos mais simples para os assistentes – hoje em dia a maioria dos fotógrafos já não se dá ao luxo de repassar trabalhos para quem quer que seja. Mas ainda assim é uma consagrada escola.
Associação: dizem que a união faz a força. Um único fotógrafo iniciante normalmente não consegue sustentar um estúdio, mas é uma prática extremamente comum dividir um. Dois ou três fotógrafos podem dividir o aluguel e custos de reforma, além dos equipamentos de iluminação. Como no começo a nossa taxa de ocupação ainda não é grande, conflitos de data são poucos e administráveis.
Alguma estratégia de marketing sempre se fará necessária – redes sociais, website institucional, blog e outras mais. É importante que se tenha alguns clientes conquistados antes de abrir um estúdio próprio. Nesse quesito, normalmente o portfolio precede tudo – um bom portfolio (muitas vezes elaborado com trabalhos pessoais não comissionados) alavanca clientes que serão atendidos em estúdios locados, e aí se a demanda exigir, parte-se para o estúdio próprio.
9 – O que eu preciso saber de tratamento de imagem?
Se for você a tratar suas próprias imagens, terá de saber bastante. Mesmo que não goste de retocar ou de mexer muito nos tons e cores da imagem, é necessário conhecer bastante coisa sobre nitidez, impressão, resolução e formatos de arquivo, além de espaços de cor. Se sua imagem sair simplesmente perfeita já da câmera, ainda assim terá de saber como preservar essas qualidades e não perdê-las pelo caminho.
Caso não queira investir todo esse tempo em aprender esse ofício adicional, contrate um retocador de confiança e fique livre para preocupar-se apenas com a captura.
10 – Vale a pena ter um estúdio próprio?
Tudo vai da sua demanda. Com poucos trabalhos por mês, ainda compensa alugar um estúdio com equipamentos. Há estúdios para todos os bolsos e necessidades, e é possível alugar até mesmo câmeras e lentes mais caras em alguns deles. Sem custos fixos, sem aluguel ou manutenção do equipamento, o estúdio alugado é uma ferramenta poderosa.
Mas é bem provável que chegue um instante em que a despesa com estúdio alugado irá superar os custos fixos de um estúdio próprio – quando esse dia chegar, mude para um estúdio com a sua cara, no local que desejar. Nele é possível atender clientes a qualquer hora, testar luzes, fazer ensaios – coisa que não é possível no estúdio alugado.
De qualquer maneira, um studium, ou local de estudo é essencial para todo fotógrafo. Mesmo que não tenha camarins, escritório ou cozinha, qualquer ambiente serve para se estudar iluminação, testar novas soluções e equipamentos. Um quarto ou garagem fechada já ajudam em algo.
Caberia aqui uma décima primeira pergunta: e agora, o que faço com essa informação toda? Na verdade, não é tanta informação assim, apenas uma pequena coletânea de esclarecimentos. Dúvidas que se repetem o tempo todo, pelo mundo inteiro – e é uma mão na roda poder ver as respostas assim, agrupadinhas. Divida-as se quiser, aproveite-as o quanto puder, concorde, discorde, construa seu conhecimento.